Hoje técnica nos EUA, ex-aluna Miriele se apaixonou pelo vôlei nas quadras do Instituto Compartilhar
[caption id="" align="alignleft" width="168"] Durante seu tempo do projeto Rexona, Miriele participou de vários festivais de Minivôlei[/caption]
Técnica e professora de Vôlei em Nova Orleans, nos EUA, Miriele Cristina Gobbo começou no antigo projeto Centro Rexona de Excelência do Voleibol e se destacou principalmente por sua dedicação
Miriele Cristina Gobbo sempre foi mais alta que as outras crianças. E seus pais, Soraya e Carlos Alberto, sempre gostaram de Vôlei – participar do projeto Centro Rexona de Excelência do Voleibol (hoje projeto Vôlei em Rede), em Curitiba, parecia um caminho natural. “Eu comecei a jogar por conta da minha mãe, que sempre gostou. Mas o pai dela não permitia que ela jogasse. Minha mãe que me incentivou, que me levava de ônibus aos treinos”.
Ela começou em 2001, no atual Núcleo Central – Curitiba/PR, como muitas crianças: tímida, acanhada. O que motivou Miriele a continuar indo para as aulas do projeto Centro Rexona foi a forma como ela era tratada: os erros não eram diminuídos ou ridicularizados, e sim tratados como oportunidades de aprendizado. Ela não se sentia julgada, e sim estimulada. “Eu lembro que os técnicos e professores também levavam muito em consideração as notas da escola, então desde cedo eu aprendi a valorizar a importância de ambas as aulas e também do meu tempo”, contou. Ali no projeto (e até hoje) o objetivo não era formar atletas, mas sim contribuir para o desenvolvimento humano e integral da garotada.
Um primeiro ano cheio de brincadeiras, aprendizado e apoio – em um ambiente acolhedor, com professores atenciosos – foi crucial para que ela se apaixonasse pelo jogo: passado esse primeiro período, não havia quem a tirasse de dentro da quadra. E essa, nem de longe, era a vontade de seus pais. O suporte foi constante e cresceu junto com o interesse pelo esporte. “Eles tiveram que largar mão de muita coisa para me levar às aulas e jogos”. Até hoje, ela leva consigo essa lembrança e a importância dos pais, estudo, professores e técnicos dos times em que jogou para que ela esteja onde está.
[caption id="" align="alignright" width="300"] Após sair do projeto, Miriele (camisa 8), participa de competições em diferentes times[/caption]
“O professor Josmar (coordenador do projeto) sempre foi muito atencioso, a brincadeira que eu mais gostava era sacar na categoria Mini 3x3 (11 a 12 anos) para treinar. Eu sempre acabava vendo as meninas mais velhas jogando”, lembrou. Antes mesmo de ir para a última categoria do projeto (ao todo são quatro), ela foi convidada para jogar pela Associação Atlética Banco do Brasil (AABB). “Eu não tinha muita ideia do que era, mas meus pais me incentivaram a fazer a peneira. Eu também gostava de ver como as meninas mais velhas jogavam, e isso me motivava a ser como elas”, contou Miriele
Sair do Centro Rexona e entrar na AABB foi uma mudança radical não apenas pela diferença de idade, mas também pela rotina. Não era mais vôlei com atividades recreativas e lúdicas, dentro dos princípios de uma metodologia própria do projeto, era treinamento para competições. “Quando comecei a sentir o gosto da coisa, quando comecei a jogar em campeonatos, senti que era aquilo que eu queria fazer enquanto pudesse”, contou.
Antes de dar o próximo passo, Miriele passou por um período de desânimo. Muitas amigas pararam na época. “Era quando o pessoal da escola começava a sair, festar, e eu nunca tinha tempo pois tinha treino, viagem, campeonato... eu me senti cansada, sabe? Mas era uma oportunidade muito grande para trocar por uma festa”. Sem abaixar a cabeça, ela fez a peneira do time do Positivo logo após terem ganho um grande campeonato – e o presente, para ela, foi uma bolsa de estudos. Pela condição financeira dos pais, seria uma oportunidade única de tentar.
[caption id="attachment_11793" align="alignleft" width="300"] Miriele (camisa 6) jogou profissionalmente nos EUA antes de criar seu próprio programa de aula[/caption]
“Meu pai viu o anúncio da peneira do Positivo. Estava super nervosa e até meio receosa, mas a bolsa era praticamente integral para o ensino médio”. Esse receio não passou em um primeiro momento, pois ela achava que seria posta de lado por não ter roupas de marca. “Coisa de adolescente, né? Mas foi completamente diferente! Fiz amizades incríveis na sala de aula e na quadra, e nunca me senti inferior por ter ‘menos dinheiro’”. Para manter a bolsa, Miriele continuou não apenas batendo bola, mas também mantendo notas altas. Ela conta que foi uma transição bem natural, os medos que ela tinha acabaram de forma rápida. Em seguida, ela iniciou a faculdade de Farmácia na mesma instituição, com uma bolsa do governo para que pudesse continuar jogando.
O projeto Rexona foi a base não apenas para essa transformação, mas também o impulso para mudanças futuras – a dedicação, apreço e paciência dos professores lá no começo fizeram a diferença. Sempre ir bem na escola, não faltar aula... tudo era um privilégio para o qual ela não podia deixar de se esforçar, para continuar progredindo. “Não só a dedicação e os valores, mas também a paixão pelo esporte começou por causa do projeto Rexona. Se eu não tivesse os professores que tive, provavelmente não seria tão bom”.
Em meados de março de 2009, então, em um treino do Positivo, uma olheira da Universidade de Tulsa, do estado de Oklahoma, nos EUA, interessou-se pelas habilidades de Miriele. “Foi muito engraçado porque eu nunca tinha pensado em vir para os EUA, não falava absolutamente nada de inglês”, adicionou. Após o treino, ela conversou com o time e perguntou quem teria interesse numa oportunidade de ir para fora do Brasil – que Miriele prontamente agarrou e começou um intensivo de inglês, para ir para a instituição americana em 2010.
“Eu tinha 17 anos, não tinha passaporte nem visto. Minha mãe não dirigia, meu pai estava morando fora do Brasil... precisei arrumar tudo sozinha em 4 meses”. E em 4 meses, Miriele fez tudo isso – viajou com a mãe, Soraya, para São Paulo de ônibus para fazer o visto, fez um intensivo de inglês (enquanto estudava Farmácia na Universidade Positivo) e recebeu a notícia de que, no mesmo ano, poderia ir para a Universidade de Brownsville, no Texas. “Eu sinceramente não sei como que tudo deu certo até hoje!”. Não foram quatro meses simples – além de lidar com os sentimentos de deixar a faculdade, amigos e família no Brasil, também vieram entraves como dificuldades com tempo na hora de fazer o visto.
[caption id="" align="alignright" width="300"] Hoje, Miriele (à direita) atua como técnica e passa para frente os valores que aprendeu no passado[/caption]
Quando viu, Miriele estava dentro do avião, voando pela primeira vez. Pouco depois, chegou na universidade e caiu a ficha: estava jogando o primeiro treino fora do Brasil. “Parecia um filme”, ela relembra. As outras meninas do time ajudavam na comunicação com o treinador americano, e a sua colega de quarto, uma holandesa 5 anos mais velha, ajudou a treinar a língua inglesa na marra.
Ela relembra dessa enorme oportunidade com carinho: toda a estrutura do esporte era nova, com roupas de treino, tênis, joelheiras; dormitório; vestiário; viagens de avião para participar dos jogos; sem falar da possibilidade de estudar numa universidade americana. “Aprendi a priorizar meu tempo. Se você não tem notas boas, perde a bolsa e volta para casa, então precisava levar tudo em consideração quando se preparava para as aulas”.
E como tudo na história, o movimento foi cíclico: durante a faculdade, Miriele ensinava vôlei para crianças durante o verão. Uma vez formada e morando em Houston, Texas, ela começou a trabalhar em uma academia. Mas algo estava faltando – era vontade de dar treino. “Eu comecei a trabalhar em um clube e não parei mais. Era muito gostoso ver as crianças aprendendo!”. Cada pedacinho da sua experiência própria era passada aos alunos, de forma que as aulas não fossem entediantes. Todo ensinamento era aliado a uma brincadeira, trazendo atividades para as crianças e adolescentes.
Hoje, treinadora em Nova Orleans, a memória favorita do antigo projeto Rexona é carregada de sonhos infantis: “A primeira coisa que me vem na memória quando penso assim é quando eu tentava chegar antes para assistir as meninas mais velhas jogando”. Após essa longa jornada de vida (que ainda está rendendo frutos e renderá muitos mais), ela relembra com carinho esse começo simples, e esse sonho que começou pela singela e honesta vontade de jogar como “as meninas do Vôlei”.
Fotos: Divulgação IC e Acervo Pessoal
Parceiros Institucionais: Delirio Tropical, Stone Pagamentos, Uptime Comunicação em Inglês, Editora Sextante